Seminário do Sintep-MT debate impactos da militarização nas escolas de Mato Grosso


Palestras apontam os danos à Educação Pública: desrespeito à legislação, desvio de recursos, ataque a gestão democrática, à valorização profissional e exclusão de estudantes.

Publicado: 28/03/2025 16:44 | Última modificação: 28/03/2025 16:44

Escrito por: Sintep-MT

Reprodução

O Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep-MT) promoveu em Barra do Garças, um ciclo de debates sobre a militarização das escolas estaduais. O evento, intitulado "Militarização das Escolas Estaduais de Mato Grosso - Impactos e Perspectivas", reuniu especialistas e educadores em três mesas temáticas: "Militarização da Educação e Gestão Democrática", "Financiamento e Condições de Trabalho nas Escolas Militarizadas" e "Caminhos para uma Educação Pública e Democrática: do PNE à Militarização". Durante os debates, foram evidenciados desvios de finalidade na aplicação de recursos da educação e impactos negativos na gestão das escolas.

Crítica ao Modelo Militarizado e Gestão Democrática

Os primeiros debates do dia trouxeram reflexões sobre a militarização e sua incompatibilidade com a gestão democrática prevista na legislação educacional. O professor doutor Odorico Ferreira Neto, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), destacou que a militarização das escolas ignora dispositivos legais, como os artigos 205 a 213 da Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o artigo 237 da Constituição Estadual de Mato Grosso. Segundo ele, a implantação dessas escolas fere a gestão democrática e desvia recursos da educação para o pagamento de militares.

A professora doutora Catarina Santos, da Universidade de Brasília (UNB) e membro da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, alertou para discursos equivocados que associam a presença de policiais dentro das escolas à segurança. "A Educação Básica no Brasil é composta por 40 milhões de estudantes, além dos pais, familiares e profissionais da educação. Quem é o público da escola pública que está sendo considerado bandido?", questionou.

Impacto Financeiro da Militarização

No período da tarde, os debates focaram no impacto financeiro e nas condições de trabalho nas escolas militarizadas. O professor mestre Gibran Freitas, dirigente do Sintep-MT, apresentou uma análise histórica do surgimento da militarização em Mato Grosso e das irregularidades que marcam sua implantação. Ele destacou a disparidade salarial entre professores da rede pública e militares designados para a gestão escolar.

Os dados apresentados mostram que um professor graduado da rede estadual recebe um vencimento bruto de R$ 5.476,24 por 30 horas semanais, com teto salarial de R$ 13.351,08 após 33 anos de serviço. Em contraste, um tenente-coronel da reserva recebe R$ 34.533,46 de salário militar, além de R$ 9.988,63 mensais em verbas indenizatórias, sem incidência de impostos ou descontos previdenciários. Segundo o professor Gibran, ao longo de 2024, 99 militares receberam R$ 7,4 milhões para atuar em escolas cívico-militares, desviando recursos que deveriam ser investidos na educação pública.

A professora doutora Miriam Fábia, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), também contribuiu para o debate, destacando que a militarização não melhora a qualidade do ensino e, ao contrário, compromete princípios fundamentais da educação pública, como a gestão democrática e a valorização dos profissionais da educação. "A escola militarizada impõe um modelo hierárquico que desconsidera os saberes docentes e restringe a participação da comunidade escolar nas decisões pedagógicas", afirmou. A pesquisadora ressaltou ainda que a adoção desse modelo desvirtua o papel da escola como espaço de construção da cidadania, reforçando uma lógica disciplinar que não condiz com os princípios do Plano Nacional de Educação.

Militarização e o Plano Nacional de Educação

Na mesa de encerramento, o professor Henrique Lopes, presidente da CUT-MT, relacionou a militarização com a violação do Plano Nacional de Educação (PNE). O PNE, instituído pela Lei 13.005/2014, estabelece 20 metas para a educação pública, entre elas a Meta 17, que prevê a valorização dos profissionais da educação, e a Meta 19, que garante a gestão democrática. "A militarização das escolas públicas viola ambas as metas de forma sistemática e alarmante", afirmou.

Além disso, o PNE determina que os recursos da educação sejam prioritariamente destinados à infraestrutura, formação de professores e materiais pedagógicos. Entretanto, em Mato Grosso, milhões são desviados anualmente para sustentar escolas militarizadas. Somente em dezembro de 2024, R$ 733 mil foram gastos com verbas indenizatórias para militares, verba que poderia ter sido utilizada para capacitação docente.

O Futuro da Educação Pública em Jogo

Pesquisas nacionais constatam que não há evidências de que as escolas militarizadas tenham melhores resultados educacionais do que as escolas públicas civis. O discurso falacioso do governo Mauro Mendes quer fazer crer que há melhoria da qualidade de ensino. A professora Catarina Santos reforça a tese de que, para justificar a existência do modelo, dizendo que são melhores que as outras escolas, vão na lógica da entrega de resultados e para isso, mandam embora os mais vulneráveis (negras, LGBTQIA+, neurodivergentes e demais grupos vulnerabilizados).

Os participantes do seminário enfatizaram que a militarização das escolas não é apenas uma questão ideológica, mas uma afronta à legislação educacional brasileira. Diante desse cenário, educadores e entidades cobram uma revisão urgente das políticas públicas estaduais, com realocação de recursos para a valorização docente e fortalecimento da participação comunitária. "A educação pública não será transformada por fardas, mas por investimentos reais nos profissionais da educação e nas comunidades escolares", concluem os especialistas.

Como resultado dos debates, o evento produziu um documento oficial consolidando sua posição contrária à militarização das escolas públicas no estado.