Professora de Geografia relata dificuldade em dar aula sobre temas diferentes da sua formação


Com a implementação do Novo Ensino Médio (NEM), teve que se preparar por conta própria para ensinar temas que não fazem parte da sua formação

Publicado: 03/07/2023 17:44 | Última modificação: 03/07/2023 17:44

Escrito por: CNTE

CNTE

Formada em Geografia pela Universidade Federal do Piauí, a professora de ensino médio Klênia Maria Alves de Sousa, 42 anos, estava acostumada a dar aulas somente desta disciplina até o ano de 2019.

Com a implementação do Novo Ensino Médio (NEM), teve que se preparar por conta própria para ensinar temas que não fazem parte da sua formação e para os quais não foi capacitada.

Uma das principais mudanças advindas com a Lei nº 13.415/2017, que ampliou o tempo mínimo do estudante na escola e definiu uma nova organização curricular para o Ensino Médio brasileiro, foi a oferta dos chamados Itinerários Formativos.

Trata-se de um conjunto de novas disciplinas, projetos ou núcleos de estudo que os estudantes escolhem como atividades extras às matérias tradicionais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).

"A mudança tem como objetivos garantir a oferta de educação de qualidade a todos os jovens brasileiros e de aproximar as escolas à realidade dos estudantes de hoje, considerando as novas demandas e complexidades do mundo do trabalho e da vida em sociedade”, informa a página do Ministério da Educação.

Klênia, que dá aula em duas escolas da rede estadual da cidade de Camocim, Ceará, falou ao site da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e conta que a teoria do NEM é bem diferente da prática.

CNTE - Hoje, você dá aula de quais disciplinas além de Geografia?

KLÊNIA - Eu ensino duas outras matérias: "Memória e Cultura Afroindígena Brasileira" e "Cultura Digital”. O professor escolhe as matérias do itinerário de acordo com suas capacidades. Muitas vezes, o cardápio do itinerário proposto para a escola não tem relação com a graduação ou formação do professor, mas ele tem que escolher alguma disciplina para trabalhar.

Quais são suas principais queixas sobre o Novo Ensino Médio?

Eu não fui capacitada para dar aulas sobre as novas disciplinas. Eu recebi apenas uma proposta com os objetivos dos itinerários que deveriam ser aplicados em sala e, mesmo sem formação, preciso fazer com que os alunos entendam. Além disso, a escola em que trabalho não oferece a estrutura adequada para  o desenvolvimento das matérias: não tem sala de vídeo, laboratório de informática é sucateado e acesso à internet precário, o que torna incoerente promover ensino e aprendizagem em cultura digital.

Como tem sido o impacto do novo modelo para os estudantes?

Para alguns alunos, ficar mais tempo na escola foi bom, já que muitos vivenciam brigas em família e situações ruins em casa. Mas para outros alunos, você percebe que estão perdendo tempo frequentando aulas superficiais. Como não tivemos capacitação, eles recebem conteúdo sem muito aprofundamento. Os estudantes são obrigados a escolher itinerários que não se identificam.

Que avaliação você faz sobre a implementação da nova legislação?

A reforma do ensino médio é necessária, pois a geração de jovens que está chegando pede mudanças, mas não da forma como foi realizada. A legislação do NEM chegou sem promover o devido diálogo e, principalmente, sem oferecer estrutura para sua execução. Faltam políticas públicas para o professor.

CONSULTA PÚBLICA

Professores, alunos, gestores e familiares podem se manifestar contra o Novo Ensino Médio por meio de uma consulta pública virtual. O prazo vai até o dia  6 de julho.É possível responder por WhatsApp,  enviando “MEC” para o número (11) 97715-4092, ou por meio do link bit.ly/consultapublicaonlinemec-web, que direciona para o aplicativo.

Alvo de críticas de entidades educacionais, o NEM, para a CNTE, não cumpriu a proposta de trazer um caráter mais dinâmico às escolas e não ofereceu alternativas aos estudantes que buscam uma preparação voltada ao ingresso no mercado de trabalho.

A CNTE defende a revogação do novo modelo e argumenta que a reorganização curricular das escolas trouxe graves problemas aos profissionais da educação e a milhares de estudantes. Leia aqui o documento aprovado pelo Conselho de Entidades da Confederação sobre a Consulta Pública do MEC em relação do NEM.