Política de resultados na educação estadual piora saúde de profissionais e estudantes
Professores e estudantes da rede estadual relatam desgaste e desânimo diante da gestão meritocrática nas escolas
Publicado: 05/09/2024 17:47 | Última modificação: 05/09/2024 17:47
Escrito por: Roseli Riechelmann
Os profissionais da Educação da rede estadual de Mato Grosso relatam ao Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público (Sintep-MT) sua preocupação com os impactos nas escolas após a implementação da política de educação do governo estadual, entre as quais a alteração de resultados dos estudantes no ano letivo de 2023. No segundo semestre de 2024 ampliam-se sinais da “síndrome de desistência”, *burnout, dos professores.
Uma professora doutora da rede estadual, que preferiu não se identificar, enviou ao sindicato um relato sobre suas angústias em ser professora nos dias atuais. Segundo ela, "este ano, como que por um passe de mágica, sinto que não sei mais fazer o que faço há 35 anos. Compreendo que precisamos nos reinventar a cada dia e adaptar nossa prática. Também entendo que os tempos mudaram e que os alunos são diferentes do que eram há 35 anos. Mas o que realmente mudou?", questiona.
Ela destaca a perda da liberdade de cátedra como um problema grave. "Não posso mais dizer que o aluno precisa de mais tempo para rever o que não aprendeu ainda. Tenho um excelente material, com quatro unidades por bimestre, mas não posso trabalhar com ele de forma sequencial. Tenho que fingir que estou ensinando. Não consigo! Sou professora, não sou fingida. Cada pessoa que aparece na escola parece saber melhor do que nós o que devemos fazer. Alguém vem nos ensinar a ser o que já somos. Isso é inaceitável!", desabafa.
Entre as preocupações destacadas pelos professores está também a política de redução do absenteísmo, que exige assiduidade independente das condições de saúde do profissional, além de ser apoiada por um sistema de controle de presença – o Webponto – inadequado para as realidades dos trabalhadores da educação.
Outra professora, de Campo Novo do Parecis, sem se identificar, expressa o conflito entre os educadores. "A pressão e as cobranças, intermináveis, sem lógica para o dia a dia da sala de aula são insuportáveis. Pacotes de formação padronizada circulam pelo estado, desrespeitando as diversas realidades das escolas nas diferentes regiões de Mato Grosso", disse.
A angústia também se estende aos estudantes. "Muitos alunos que sempre se dedicaram aos estudos agora estão desmotivados pela decisão de gestores de aprovação automática, pois não precisam mais se esforçar para passar de ano", afirma a professora.
Uma estudante do segundo ano, do município de Campo Novo do Parecis, relata que se tornou relaxada nos estudos. "Não levo mais nada para fazer em casa, faço tudo na escola. Não vou me dedicar tanto como no ano passado. Se o governo deu essa recompensa para os que não fizeram nada, por que me esforçar?", diz.
A professora destaca ainda um problema maior com os estudantes que, nas avaliações finais de 2023, não conseguiram desenvolver as habilidades necessárias para avançar, mas foram aprovados mesmo assim. "Quando comparecem às aulas, não têm interesse e nem conseguem acompanhar o conteúdo. O estado não implementou, como havia prometido, meios para recuperar a aprendizagem desses estudantes. Além disso, há os alunos da busca ativa, que vêm forçados pela lei, mas não permanecem na escola", concluiu.
• Segundo o Ministério da Saúde, Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional é um distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante.