Mais de 70% dos professores da rede estadual relatam adoecimento pelo uso de plataformas digitais


Exclusivo: Dados de estudo inédito sobre os impactos da digitalização da educação no Paraná serão divulgados semanalmente pela APP ao longo de agosto

Publicado: 04/08/2023 10:59 | Última modificação: 04/08/2023 10:59

Escrito por: APP/Sindicato

APP-SIndicato

Se faltavam informações concretas sobre os impactos da política de plataformização adotada pelo governo Ratinho Junior na rede estadual de educação, não faltam mais. Uma pesquisa pioneira realizada pela APP-Sindicato e o Instituto Pesquisas de Opinião (IPO) com educadores(as) de todo o Paraná revela os reflexos da intensa digitalização nas condições de trabalho da categoria e no processo de ensino-aprendizagem.

O levantamento traz dados alarmantes, como o grau de adoecimento e sobrecarga atrelados ao modelo, a percepção de baixa aprendizagem dos(as) alunos(as) e as deficiências estruturais da rede para atender às exigências tecnológicas. Também chama atenção o elevado número de professores(as) que se sentem assediados(as) com a pressão exercida pelo cumprimento de metas e a obrigatoriedade de uso de plataformas.

Quase a totalidade dos(as) educadores(as), 91,3%, se declaram sobrecarregados(as) com a avalanche de novas plataformas, aplicativos e meios tecnológicos somados à cobrança pelo cumprimento de metas. Já 74,3% reconhecem impactos negativos do modelo na sua saúde física e/ou mental, enquanto uma parcela maior (78,3%) afirma ter colegas que adoeceram em decorrência das dificuldades impostas pelas novas tecnologias.

Assédio e abuso

Outro dado descortina a deterioração das condições de trabalho: quatro a cada 10 educadores(as) (43%) se sentem assediados(as) e reconhecem abuso de autoridade na pressão exercida sobre a comunidade escolar para utilizar as plataformas. No cerne do problema está a imposição do modelo e a pressão pelo cumprimento de metas de uso. Sete a cada 10 entrevistados(as) (73%) se sentem obrigados(as) a adotar os meios tecnológicos impostos pela Secretaria da Educação e 95% dizem que há cobrança por metas e resultados.

“A sensação de sobrecarga de trabalho está associada à forma como vem ocorrendo a política de implantação de uso das plataformas digitais. Os(as) professores(as) estão sentindo a precarização das condições de trabalho e isso afeta a sua saúde física e emocional”, avalia a socióloga Gisele Rodrigues, gerente de pesquisas do IPO.


Em respostas abertas, os(as) entrevistados(as) puderam expressar o motivo de relacionar o adoecimento ao uso de plataformas
Segundo a cientista social, a categoria não é contrária à adoção de novas tecnologias e metodologias de ensino, mas critica o excesso de plataformas, as limitações da rede e a obrigatoriedade. “A pesquisa sistematizou as várias fontes de estresse, que começam pela falta de diálogo, passam pela fragilidade dos treinamentos e pela falta de equipamentos e têm seu ápice na limitação da autonomia do educador e no estabelecimento de metas, que não estão sendo construídas de forma horizontal com a comunidade escolar”, diz.

Opção, não obrigação

De fato, 90% dos(as) respondentes concordam que as plataformas deveriam ser de uso opcional nas escolas, servindo como instrumentos de apoio pedagógico e não de uso obrigatório. Os dados da pesquisa devem orientar a atuação sindical sobre o tema da plataformização da educação, uma das pautas centrais da APP e tema da última Edição Pedagógica do Jornal 30 de Agosto, que apresentou o Manifesto por uma educação humanizadora em tempos de tecnologias digitais.  

“É possível outra relação com as plataformas educacionais digitais”, explica a secretária Educacional da APP-Sindicato, Vanda Santana. “A pesquisa demonstra que a categoria quer outro modelo de inserção das tecnologias no ambiente escolar, dialogado e não imposto, que respeite a autonomia do(a) professor(a) para trabalhar conteúdos e sirva de suporte ao invés de ocupar o centro das atenções de estudantes e educadores(as).”, complementa.

O Sindicato trabalha para abrir debate com a Secretaria da Educação sobre o tema e propor o estabelecimento de uma política que priorize a interação humana e a autonomia docente, mantendo as tecnologias como ferramentas que auxiliem o trabalho pedagógico e não como instrumentos de controle e substituição do papel dos(as) professores(as). A posição vem ao encontro de um relatório publicado na última semana pela Unesco, braço da ONU para a educação, que aponta prejuízos à aprendizagem advindos do uso excessivo de tecnologias na sala de aula.

Para Margleyse dos Santos, secretária executiva Educacional da APP, o conjunto de informações trazidas pela pesquisa reitera as reflexões já elaboradas pelo Sindicato acerca do fenômeno da plataformização e sua condução pelo governo. “Há um mal estar generalizado nas escolas. Professores(as) e pedagogos(as) tem se sentido cada vez mais coadjuvantes e menos protagonistas do processo de ensino-aprendizagem, intermediando a relação de estudantes com a tecnologia e conteúdos que já vêm prontos”, afirma.

A falta de autonomia e as percepções da categoria sobre os impactos da digitalização na aprendizagem dos(as) estudantes será o tema da próxima reportagem da APP-Sindicato acerca dos resultados da pesquisa. “Devido à profundidade e extensão dos dados captados, optamos por divulgar os resultados em partes, amadurecendo as análises e fomentando o debate na categoria”, detalha Vanda. Os conteúdos serão publicados semanalmente ao longo do mês de agosto.

Sobre a pesquisa

A pesquisa “Plataformização da Educação” foi realizada pelo IPO entre os dias 28 de junho e 7 de julho de 2023, com 300 professores(as), pedagogos(as) e diretores(as) da ativa sindicalizados(as) à APP. A amostra é representativa por região do estado, sexo e faixa etária e a abordagem foi conduzida por ligações telefônicas.

O estudo foi contratado pela APP-Sindicato. A Secretaria Educacional da APP trabalhou em conjunto com os(as) cientistas sociais do Instituto para desenvolver o questionário, que incluía perguntas abertas e estimuladas. Para completar as 300 entrevistas, que somaram mais de 100 horas de gravação, cerca de 6 mil educadores(as) foram contatados. A margem de erro é de 5,9% com intervalo de confiança de 95%.

Pesquisadores(as) e veículos de imprensa podem ter acesso a mais detalhamentos entrando em contato com a Secretaria de Comunicação da APP pelo Whatsapp (41) 9249-2328.

:: Acesse a parte I do relatório do IPO sobre a pesquisa “Plataformização da Educação”