Escolas onde a maioria dos alunos são negros têm pior infraestrutura, mostra estudo
Pesquisa revela disparidade de recursos entre escolas com mais de 60% dos alunos negros, em termos de bibliotecas, laboratórios, quadras e acesso à rede de esgoto
Publicado: 16/04/2024 16:30 | Última modificação: 16/04/2024 16:30
Escrito por: Alice Andersen/ Revista Fórum
Uma análise conduzida pelo Observatório da Branquitude mostra que as escolas públicas com maioria de estudantes negros apresentam uma infraestrutura inferior em comparação às instituições onde a maioria dos alunos matriculados é branca. Essa disparidade é evidente quando se observa a disponibilidade de recursos como bibliotecas, laboratórios, quadras esportivas e até mesmo no sistema de esgoto.
É o que revela o estudo “A cor da infraestrutura escolar: diferenças entre escolas brancas e negras”, com base nos dados fornecidos pelo Censo Escolar de Educação Básica, de 2021, e pelo Índice de Nível Socioeconômico (Inse). A metodologia empregada na pesquisa foi inspirada pelo trabalho desenvolvido pelo Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (Cedra).
Nesta abordagem, escolas são classificadas como predominantemente brancas quando possuem 60% ou mais de alunos que se autodeclaram como brancos. Da mesma forma, escolas são consideradas predominantemente negras quando 60% ou mais dos estudantes se identificam como negros.
Há disparidade de recursos quando os alunos são negros
A análise destaca um resultado significativo: a maioria dos alunos em escolas de educação básica no Brasil com infraestrutura superior são brancos, representando 69% do total. Em contraste, nas escolas onde a maioria dos alunos é negra, mais da metade não tem acesso a uma biblioteca (50,2%), um laboratório de informática (53,1%) ou uma quadra de esportes (51,7%).
“A desigualdade está ali já na primeira escola que a criança entra. Isso é muito tocante. Se a pessoa já começa a estudar com esse cenário de desigualdade toda a sua formação será marcada por essa desvantagem”, afirma Nayara Melo, analista de pesquisa do Observatório da Branquitude. Para ela, o cenário é ainda mais preocupante nas escolas municipais. “O financiamento dessas escolas não é só do governo federal, as escolas municipais são extremamente fragilizadas e esse déficit leva a uma soma de desigualdades”, reitera a analista.
Estudantes em vulnerabilidade social são os mais afetados
Em relação ao Inse, o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) coleta dados dos alunos para gerar esses resultados, e classifica os níveis socioeconômicos de 1 a 7. O nível 1 representa famílias com maior vulnerabilidade e menor poder econômico, enquanto o nível 7 corresponde a famílias com maior renda e acesso a oportunidades.
Pelo menos 75% das escolas com maioria de alunos negros estão nos níveis 3 e 4 do Inse, onde os estudantes geralmente têm acesso a uma televisão, um banheiro e sinal de wi-fi em casa. Por outro lado, 88% das escolas com maioria de alunos brancos abrigam alunos dos níveis socioeconômicos mais altos (5 e 6), que têm acesso a um veículo próprio, uma ou duas televisões, um ou dois banheiros em casa, wi-fi, entre outros bens.
No nível 1, onde as condições socioeconômicas das famílias são mais precárias, foram identificadas 13 escolas. A maioria dos alunos nessas escolas é negra, e as escolas estão localizadas principalmente no Norte e Nordeste do país, em estados como Amazonas, Pará, Amapá e Maranhão. Todas essas escolas não possuem coleta de lixo e rede de esgoto, e um terço delas também não tem acesso à água potável.
No extremo oposto, estão os alunos que se enquadram no nível 7 do Inse. Um total de 32 escolas, a maioria localizada em áreas urbanas principalmente na região Sul do país (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná), mas também no Sudeste, em estados como São Paulo e Minas Gerais. Neste grupo, mais de 70% das escolas possuem biblioteca, coleta de lixo, laboratório de informática e quadra de esportes, além de garantir o acesso à água potável.
A coordenadora da pesquisa no Observatório da Branquitude, Carol Canegal, ressalta a importância de se fazer o estudo com um recorte racial. “Infelizmente o futuro de muitos estudantes tem sido afetado pela falta de estrutura básica e pela displicência do poder público ao olhar para a realidade. Com esta publicação pretendemos contribuir de forma mais ampla com a agenda de enfrentamento de desigualdades, dentre elas as raciais, na educação básica”, diz.