Educadores repudiam a tentativa de censura imposta aos estudantes da região de Santa Cruz do Sul/RS


Diretora de escola pública proíbe livro vencedor do Prêmio Jabuti, incluído no catálogo do Programa Nacional do Livro Didático, por achar inadequado para os estudantes do Ensino Médio

Publicado: 04/03/2024 18:34 | Última modificação: 04/03/2024 18:34

Escrito por: CNTE

Divulgação

Na última semana, a diretora da Escola Ernesto Alves, da cidade localizada na região central do Estado gaúcho, alcançou aquilo que ela pretendia quando se dirigiu às suas redes sociais para tentar maldizer a obra literária de Jeferson Tenório, chamada “O Avesso da Pele”. Vencedor do Prêmio Jabuti na categoria “Romance Literário” em 2021, o livro que denuncia o racismo estrutural a que o Brasil está submetido e, por isso, faz parte do acervo do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNDL) do Ministério da Educação (MEC) desde aquele ano, foi alvo de ataques virulentos pela diretora de uma escola de Ensino Médio da cidade.

Vendido em mais de 10 países e adaptada inclusive para o teatro, a obra literária e sua apropriação pelo processo pedagógico nunca foi a preocupação da referida gestora escolar. Se o fosse, ela não teria usado as suas redes sociais, em um modus operandi bem conhecido pelo país nos últimos anos, para fazer o que chamou de “denúncia”. Além do mais, a diretora não usaria as palavras que usou, atacando o autor da obra, doutor em Teoria Literária, e tampouco o MEC e o Governo Federal em nome dos “valores e dos bons costumes” que uma escola deve ter. Seu objetivo parece mesmo ter sido o de criar a celeuma que criou, desconsiderando que a aprovação dessa obra passou pelo crivo de uma comissão formada por educadores/as e que a inclusão do livro no PNDL, feita ainda pelo governo anterior - e, portanto, diferente daquele que ela objetivou criticar – passou pelo pedido expresso de sua própria unidade escolar, ao qual ela diz fazer a gestão e ser responsável.

A sua polêmica tinha por objetivo impor uma censura aos/às próprios/as estudantes da cidade de Santa Cruz do Sul que, se tivesse obtido êxito, os/as impediriam de ter acesso à obra e à crítica ao problema nacional e secular tão importante como é o racismo estrutural no Brasil. Trata-se de uma disputa na arena dos valores que pressupúnhamos ter sido superada nas últimas eleições gerais do país, mas que, infelizmente, ainda pautam o debate público. O país não pode ficar refém que sua educação se paute por questões e debates que estão para além da arena da boa prática pedagógica em nossas unidades escolares. As ideologias e crenças que cada pessoa pode exercer em sua vida privada não devem se sobrepor aos objetivos educacionais mais amplos e centrais do país.

Estarrecidos/as com o ocorrido, educadores/as de todo o Brasil repudiam a tentativa de censura imposta pela referida gestora escolar e o alvoroço por ela criado. O processo pedagógico necessário também na atividade de gestão escolar da diretora da Escola Ernesto Alves fica agora comprometido, em um momento em que surgem até petições para o afastamento daquela que deveria se preocupar com a boa gestão escolar, e nunca em impor censuras de quaisquer ordens aos/às seus/uas estudantes.

Brasília, 4 de março de 2024

Direção Executiva da CNTE