Educadores debatem a importância do currículo na disputa do projeto de sociedade


“Quando a gente fala de currículo estamos falando de formação humana, de educação, de um projeto de sociedade”.

Publicado: 29/03/2021 16:09 | Última modificação: 29/03/2021 16:09

Escrito por: Roseli Riechelmann

Sintep-MT

“Quando a gente fala de currículo estamos falando de formação humana, de educação, de um projeto de sociedade”. A afirmação da professora doutora da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), Márcia Cossetin, foi apresentada ontem (24/03) durante o Seminário Virtual, Currículo: Um espaço de disputa e construção coletiva, realizado pelo Sindicato dos Trabalhadores no Ensino Público de Mato Grosso (Sintep/MT).

A abordagem da professora Márcia, assim como dos dois outros convidados – professora doutora Érika Virgílio (UFR) e o presidente do Sintep/MT, Valdeir Pereira – dialogou com o tema “A Organização Curricular Humana da Educação Pública, o Direito à Educação, a Intervenção da BNCC e Reforma do Ensino Médio, frente ao desafio da Educação Integral e de Tempo Integral”.

A professora focou no conceito de educação humanizadora vinculada à educação integral, a partir dos estudos de Karl Marx, Engels e Antonello Manacorda. Nesse sentido defende a educação polítécnica e integral que abranja o desenvolvimento intelectual, físico e tecnológico dos sujeitos. Com esse olhar, desconsidera a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o novo Ensino Médio, por estar retomando um projeto de formação utilitarista e instrumentalizadora, voltada para preparar os sujeitos para execução de tarefas.

Instrumental

As resoluções da BNCC e a Reforma Ensino Médio retomam projetos da década de 90, de cunho neoliberal, ou seja, privatistas. Segundo a professora, isso fica evidente quando se analisa os formuladores da Base, cujos representantes estão todos vinculados a instituições, Ong’s e institutos de caráter privado (Fundação Lemann, Instituto Natura, entre outros).

A professora ressalta que essa formulação de educação instrumentalizadora também atinge os professores, a partir das políticas de formação inicial e continuada. Segundo Márcia, essa ação na verdade é internacional e ditada pelo Banco Mundial, que tem condicionalidades para os países, entre elas a redução de investimento na educação e no quadro de professores.

Engessado 

A professora Erica enfatizou que o currículo não pode ser único e contestou a BNCC e a Reforma do Ensino Médio. “A lógica de currículo é do século passado e foca na empregabilidade e empreendedorismo apresentados pelos grupos financeiros que estão dentro da formulação da BNCC”, destacou.

Para Érika, o currículo proposto pela BNCC é engessado e coloca em dúvida o potencial profissional dos professores, pois imprime uma lógica prescritiva de conteúdo. O projeto, segundo ela, ignora a construção coletiva e a perspectiva contextual de produção curricular. “Ele não se preocupa que os alunos aprendam a mesma coisa ao mesmo tempo, e que todas as escolas tenham que fazer igual. É a mágica do conhecimento. O currículo é traçado pelo viés eficientista”, destaca. 

Disputa

Para o presidente do Sintep/MT, Valdeir Pereira, a educação pública sempre foi um projeto de disputa, e os atuais atores envolvidos no processo tentam demonizar a concepção de escola pública voltada para a classe trabalhadora, como aquela que não produz resultados. “Os mesmos que deveriam assegurar a qualidade”, disse.

Valdeir lembrou que a universalização e obrigatoriedade da educação no Brasil, expandiu as escolas para diferentes localidades com públicos diferentes. E, diante disso, o currículo não pode estar descolado dessas realidades. Fez a defesa da participação da comunidade escolar na definição da escola que querem (Gestão Democrática), com um currículo que respeite as suas singularidades. “Não podemos pensar numa escola pública que não tenha como finalidade melhorar as condições de vida das pessoas que nela estão inseridas”, destacou.

O dirigente lembrou que a educação é um direito dos estudantes e deve ser respeitada garantindo a igualdade de condições de ingresso e permanência. Para Valdeir isso não se dá quando o governo defende as escolas militares, que são seletivas, ou mesmo quando deixa de assegurar as condições de aprendizagem, no período de pandemia. “De 2019 a 2020, o estado perdeu 25 mil matrículas”, exemplificou.

Valdeir citou que a BNCC tolhe o direito dos estudantes a um currículo pleno, que contemple a cultura, as atividades físicas e a pluralidade de conhecimento. “Mais tempo na escola não caracteriza uma educação de tempo integral. É apenas mais do mesmo”, afirmou.  

Encerramento

O Seminário Online do Sintep/MT prossegue hoje (25/03), a partir das 18h30, pelo facebook e you tube do Sintep/MT, com o debate “A Construção Histórica da Educação Pública no Brasil e em Mato Grosso, a Importância da Gestão Democrática do PPP, e os Limites Colocados pela Legislação Educacional”. A temática foi trabalhada pelo ex-deputado federal, professor mestre, Carlos Abicalil, e pelo secretário adjunto de Organização Sindical do Sintep-MT, conselheiro do Conselho Estadual de Educação, professor Dirceu Blanski.

Fonte: Sintep-MT