Conectadas sim, digitais, não: estudo mostra como é usada a internet nas escolas públicas


Em Mato Grosso, há sinal de internet mas faltam equipamentos para alunos acessarem a rede

Publicado: 17/04/2021 09:10 | Última modificação: 17/04/2021 09:10

Escrito por: Laura Nabuco/O Livre

Ednilson Agui

Quando se trata de educação pública no Brasil, ter sinal de internet na escola não significa a inclusão digital dos alunos. Em Mato Grosso, por exemplo, 95% das cerca de 770 unidades da rede estadual de ensino (dados do Censo Escolar de 2019) estão conectadas e 80%, em tese, utilizam essa internet como ferramenta para aprendizagem dos alunos.

Os números são do Mapa Integrado de Conectividade na Educação, um levantamento realizado em 140 mil escolas do país pelo Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB) e divulgado no final de março.

O levantamento não revela com clareza, contudo, o que significa, na prática, “usar a internet como ferramenta para aprendizagem”.

Diretora da Escola Estadual Ana Neri, localizada em Juína (740 km de Cuiabá), a professora Neusimar Gonçalves da Rocha contextualiza a realidade mato-grossense: nesta e na última escola em que trabalhou – a Escola Estadual Padre Ezequiel Ramim –, a internet é acessada quase que exclusivamente pelos professores.

Tê-la como ferramenta de aprendizagem, portanto, significa pesquisar materiais que possam ser transmitidos aos alunos nas salas de aulas convencionais, do jeito “tradicional” de ensino.

“Aqui em Mato Grosso, a maioria das escolas não têm mais laboratório de aprendizagem com os computadores. A gente usa a internet mais para o planejamento, as atividades do dia a dia. Quem mais usa são os professores, a equipe gestora”, ela afirma.

Nem sempre foi assim

A diretora afirma que há cerca de 7 ou 8 anos, havia laboratórios disponíveis para os alunos. As duas escolas mantinham um cronograma que possibilitava aos professores de todas as turmas e disciplinas realizarem atividades com os estudantes nesses espaços.

As máquinas, segundo ela, foram adquiridas com dinheiro do governo federal e caberia ao governo do Estado bancar a manutenção. Desde 2015, no entanto, não há mais empresa contratada para fazer esse serviço e, à medida em que os computadores foram deixando de funcionar, os laboratórios foram sendo desfeitos.

“Passamos a ter somente a Biblioteca Integradora, que tem um ou dois computadores para pesquisa e que os alunos podem usar”, ela completa.

Quanto menor e mais longe, pior

O mapa da conectividade mostra que, no caso de Mato Grosso, esse uso da internet – que seja para elaborar aulas – vai diminuindo de acordo com a distância e o tamanho da escola.

Na zona rural, 45% das unidades estaduais de ensino que têm acesso à internet a usam somente para atividades administrativas, ou seja, sequer os professores têm acesso para pesquisas que poderiam ser levadas para a sala de aula.

E enquanto 92% das escolas com mais de 500 alunos usam a internet como ferramenta de aprendizagem, só 62% das que têm menos de 200 estudantes fazem o mesmo.

A situação é ainda pior na rede municipal de ensino. Das cerca de 1.490 escolas municipais que existem em Mato Grosso (dados do Censo Escolar 2019), 88% têm sinal de internet.

Desse total, 37% estão localizadas em zonas rurais. E por essas regiões, só 35% das escolas usam a conexão com a rede mundial de computadores para, ao menos, preparar as aulas de seus estudantes.

E o tamanho também importa. Em 75% das escolas municipais com menos de 50 alunos, a internet é só para o setor administrativo. Já entre as que têm de 500 a 1 mil estudantes matriculados, 77% usam a conexão para melhorar as práticas de ensino.

Como fica o ensino híbrido?

Diretora-presidente do Centro de Inovação para a Educação Brasileira – responsável pela pesquisa –, Lúcia Dellagnelo chega a mesma conclusão apontada pela professora Neusimar, diretora da escola de Juína: “não estamos usando a tecnologia como uma alavanca para a educação brasileira”.

E ter escolas, estudantes e professores conectados é a base para a implementação do ensino híbrido no país, “que já era uma forte tendência na educação e agora assumiu papel central no contexto da pandemia”, completa Dellagnelo.

Uma tendência que, pelo menos em Juína, ainda vai demorar a se concretizar. Segundo a diretora da Escola Estadual Ana Neri, embora só cerca de 20% dos alunos tenham dito que não têm acesso a internet para fazer as atividades remotas durante a pandemia, a realidade é que na maioria das casas, a conexão se dá por um único aparelho celular que precisa ser dividido entre a famílias, às vezes, com três ou mais crianças em idade escolar.

O que diz o Governo de Mato Grosso?

Procurada pela reportagem do LIVRE a Secretaria de Estado de Educação (Seduc) afirmou que prepara uma licitação para compra de 40 mil notebooks para uso dentro de sala de aula. A Pasta também estuda adquirir chips de celular para garantir acesso a internet a todos os estudantes.

Confira a íntegra da nota:

“A Secretaria de Estado de Educação (Seduc-MT) esclarece as ações para ampliar o acesso à internet nas escolas:

1. Cerca de R$ 7 milhões serão repassados para todas as escolas da rede estadual contratarem serviço de internet com no mínimo 200 megabits, adquirirem roteadores e prover melhorias na infraestrutura de cabeamento das salas de aulas, com roteamento de sinal para cobertura (WiFi) de todos os espaços da escola. Assim, será garantido acesso à internet tanto no setor administrativo como nas salas de aula.

2. A Seduc repassou diretamente na conta de todos os professores que estão em sala de aula (cerca de 18 mil) R$ 3.500,00 para comprarem um notebook. Todos vão receber, por três anos, R$ 70 por mês para pagar uma internet.

3. A Seduc prepara uma licitação para a compra de notebooks para as escolas – setores administrativos e para todas as salas de aula.

4. Para os alunos, serão comprados 40 mil notebooks para uso dentro de sala de aula.

5. A Seduc estuda a compra de chips de celular para garantir internet para todos os estudantes.

6. Vale ressaltar que apenas 45% dos estudantes da rede estadual de ensino possuem internet em casa.“

O Livre/Laura Nabuco