“Se as verdades políticas declaradas ou aproximadas por Maquiavel fossem amplamente conhecidas pelos homens, o sucesso da tirania e todas as outras formas de governo político opressor seriam muito menos prováveis”.
James Brunham
A ‘Operação Office Crime’, bateu à porta do governado do Estado, quando membro da segurança governamental aparece no complexo assassinato do advogado Renato Nery. Esse fato se agrava ainda mais, com um possível vazamento de informações da ‘Operação’ que deve gerar grande repercussão e controvérsias, especialmente por envolver segurança do governador Mauro Mendes, que foi demitido algumas horas antes de estourar a ‘operação’.
Esses eventos levantam questões importantes neste momento que o governo teima em militarizar a educação e as escolas, afirmando peremptoriamente que a militarização é capaz de impor valores, sem mencionar quais.
Os valores que defendemos estão explicitados na nossa Constituição Federal e ratificados na LDB, conforme comentado pela CNTE:
“...A educação como direito subjetivo e social é condição elementar para a emancipação dos sujeitos históricos e para a formação de cidadãos conscientes de direitos e deveres. E, ao negar ou condicionar o direito à educação a valores antidemocráticos, negacionistas ou que estimulam preconceitos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e orientação sexual, de classe social ou de ideologia política, a sociedade perde a capacidade de combater as barbáries e as desigualdades que impedem o progresso coletivo e sustentável”. (disponível em https://cnte.org.br/noticias)
A intransigente defesa de renomados autores nacionais, internacionais e de grande parcela dos educadores, conferiu ao educador Paulo Freire o título de Patrono da Educação Brasileira, título este que o governo passado tentou subtrair como se pudesse com isso apagar a história do ilustre educador.
“...os ataques perpetrados por setores reacionários da sociedade brasileira contra a educação e seus profissionais, buscam, na verdade, fragilizar a perspectiva do pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205/CF)”, Brasília, 19 de outubro de 2023
O que devemos aprender com a ‘Operação Office crime’?
Suponho que para fazer parte da segurança de uma autoridade como um político, chefe de estado ou figura pública, envolve um processo rigoroso e criterioso para a escolha do profissional que irá atuar nessa função. Requisitos qualificadores como formação acadêmica em áreas como segurança, criminologia, talvez até uma avaliação de antecedentes que deve observar se há histórico criminal ou comportamentos que comprometam a segurança da autoridade nos parece ser indispensável.
Provavelmente uma avaliação psicológica para garantir que aquele profissional, tenha perfil adequado para o trabalho, também deve ser fundamental, pois exige controle emocional e capacidade de lidar com situações de alta pressão, além de experiência e reputação para o trabalho que irá desenvolver.
Nos preocupa deveras, é se no alto escalão da segurança governamental, pode ocorrer de ter alguém supostamente envolvido num complexo crime, como vem sendo relatado na operação ‘Office Crime’, o que poderemos ter no ambiente escolar, onde os profissionais da educação desconhecem o processo e a forma de escolha dos militares que irão atuar na escola?
Democraticamente, conhecemos os critérios de escolha dos profissionais da educação que são lotados na rede pública de ensino. Já em se tratando dos militares que têm sido lotados nas escolas como dito acima, nada sabemos sobre as escolhas. Segundo Etienne, grande filósofo, ‘governante cria uma pirâmide ilusória e transfere um pouco do poder para meia dúzia de tenentes, que repetem o processo. Esses subalternos, achando que realmente têm algum poder, submetem os abaixo deles com mão forte.
Assim, o Estado submete uns por intermédio dos outros, e dá razão ao adágio que diz ser a lenha rachada com cunhas feitas da mesma lenha’. (disponível em Resenha: Discurso da servidão voluntária - https://www.estoico.com.br/)
Os profissionais da educação, professores, vigias de escolas conhecem os estudantes e estão habituados a lidar com uma variedade de situações e desafios no ambiente escolar e com a diversidade de estudantes, cada um com seu histórico de vida, suas diferentes necessidades e sua forma de aprender.
O professor igualmente, em sua formação, é preparado para a gestão de sala de aula, onde criam o ambiente de aprendizagem produtiva, desenvolvendo estratégias para a convivência social dos alunos e a superação de possíveis indisciplinas de alguns alunos.
No entanto, o governo de MT vem buscando convencer os pais que a militarização vai trazer disciplina, ordem, e ensinar valores, mesmo sem dizer quais, e melhoria da qualidade do ensino de crianças, adolescentes e jovens.
Sobre este aspecto recorremos ao que diz Da Silva (2019, p.9) “Não há, no Brasil, estudos que avaliem objetivamente o efeito da disciplina militar nos processos de ensino-aprendizagem[...]. Ou seja, não existem evidências conclusivas de que regras rígidas melhoram efetivamente o comportamento e a disciplina dos estudantes. Assim, tal argumento, de que a “disciplina militar melhora o desempenho dos estudantes”, pode ser também uma falsa afirmação. É sabido que o melhor desempenho das escolas militares se deve ao fato desta, selecionar de diversas formas, os melhores estudantes para o aceite da matrícula.
A rígida disciplina, que inclui suspensões e expulsões, pode inclusive funcionar como mecanismo de exclusão dos alunos com mais dificuldade de aprendizagem e socialização, exatamente aqueles que mais precisam do ambiente escolar para terem pleno desenvolvimento cognitivo, social, cultural e afetivo.
Desafiamos a Seduc MT a apresentar pesquisa e dados qualitativos comprobatórios que demonstrem que os profissionais da educação são incompetentes para educar e inclusive, estudos sobre histórico de violência escolar e a incapacidade dos profissionais da educação em lidar com a situação.
Queremos afirmar assertivamente, que coldre, viatura parada na porta escola, fardamento, policiamento dentro da escola pública, xerife de sala, não educa, adestra pela submissão! A atuação intimidadora dentro de uma escola não educa para a democracia, podendo causar riscos para a juventude em fase de formação, pois concorre para a instalação de um ambiente de medo e ansiedade.
É bom que se diga, que as consequências de tudo poderão manifestar-se fora do ambiente escolar opressivo, em comportamentos desumanizados e hostis. A propósito do que vemos acontecendo através dos noticiários, inclusive no ‘office crime’, mostrando a presença de policiais que apesar da ‘formação’, age de forma inadequada afetando a reputação da instituição e sua capacidade de funcionar adequadamente.
Concluindo:
“Ai daqueles e daquelas, entre nós, que pararem com a sua capacidade de sonhar, de inventar a sua coragem de denunciar e de anunciar. Ai daqueles e daquelas que, em lugar de visitar de vez em quando o amanhã, o futuro, pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e com o agora, ai daqueles que em lugar desta constante viagem ao amanhã, se atrelem a um passado de exploração e de rotina.” Paulo Freire
Por Maria Aparecida de Arruda Cortez, Graduada em Pedagogia e TAE (aposentada) – Rede Estadual de Educação