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Independência e autonomia se aprendem na escola!

Publicado: 06/09/2023 15:41

Nessa semana em que o país comemora o Dia da Independência do Brasil, depois que essa data tão importante foi capturada pelo antigo presidente brasileiro, assim como nossa bandeira nacional – símbolo maior de nossa emancipação enquanto país –, é fundamental refletir sobre o significado dessa tão potente palavra. Independência é um termo que está intrinsecamente ligado à noção de autonomia, insubmissão e liberdade.

No campo da política, a gente assumir a nossa autonomia enquanto povo significa dizer que somos capazes de nos autogovernar, sem nenhuma interferência de outros países, interesses ou projetos alheios aos nossos próprios enquanto nação que somos.

Trata-se de uma potente insubmissão a qualquer imperativo que não venha de autoridade legítima que, na democracia, regime que escolhemos viver, significa expressamente respeitar a soberania do voto popular e o poder por ele conferido, se justo e reto for o seu exercício.

E isso tudo está ligado às noções de liberdade, direito básico de todo cidadão e de toda cidadã. Não por acaso, na filosofia, todos esses conceitos estão intrinsecamente ligados uns aos outros: liberdade como independência do ser humano, autonomia e autodeterminação.

Por mais que todos esses conceitos possam parecer abstratos e distantes de nosso dia a dia, eles nos são ensinados e incutidos desde o chão da escola. É pela educação que aprendemos esses valores. E somente uma educação que se preze emancipadora e libertadora pode almejar forjar esses conceitos em nossa sociedade.

E nunca é demais lembrar que todo nosso atual sistema educacional, construído no Brasil desde a promulgação da Constituição de 1988, conhecida como Constituição Cidadã, é alicerçado nesses princípios de liberdade e autonomia.

O artigo 206 da Constituição estabelece que a liberdade de “aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento” é um princípio estruturante do sistema nacional de educação, bem como o respeito ao pluralismo de ideias e concepções pedagógicas.

Nesse esteio, veio a nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que, em seu artigo 15, estabelece que “os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público”.

Liberdade e autonomia, portanto, são eixos estruturantes de nossos sistemas de ensino. Tarefas difíceis de serem cumpridas e exercidas, especialmente em tempos em que gostamos tanto de atribuir a outros as tarefas que poderíamos, de forma autônoma, fazer por nós mesmos.

Quando o artigo 15 da LDB, acima citado, indica que as escolas devem ter autonomia pedagógica e administrativa dentro de seus respectivos sistemas de ensino, isso quer dizer que, em grande medida, as escolas podem e devem, dentro de um mínimo razoável e estabelecido em normativos mais gerais, propor como se dará o processo de ensino- aprendizagem do conteúdo oferecido aos seus/suas estudantes.

E o que propõe a nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da educação básica, aprovada pelo Presidente golpista Michel Temer e seu então ministro Mendonça Filho, em dezembro de 2017? Impor uma referência obrigatória para a elaboração dos currículos escolares e propostas pedagógicas para a nossa educação. A BNCC, é bom lembrar, é aquele normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais.

O que quer dizer a confrontação entre o que está prescrito no artigo 15 da nossa LDB, inspirada no modelo educacional proposto no texto de nossa Constituição Cidadã de 1988, e essa nova BNCC que está sendo empurrada goela abaixo das nossas redes de ensino do país, pelos interesses das fundações privadas interessadas no “negócio” da educação?

Que a BNCC termina por contrariar o que está expresso em uma legislação maior, que no caso é a própria LDB e, por que não dizer, a Constituição brasileira. Quando o Conselho Nacional de Educação (CNE/MEC) aprovou essa BNCC do Ensino Médio, ainda em dezembro de 2018, ele ratificou um modelo educacional voltado ao setor empresarial, que exclui a nossa juventude da escola e ataca a formação cidadã que tanto almejamos naquela construção coletiva feita desde Paulo Freire, antes mesmo de 1988, mas consolidada naquele ano.

Educação rima com liberdade, autonomia e independência. Qualquer modelo que se tentar impuser na sociedade, com outros valores, não poderá prosperar. Por mais que tenhamos dificuldades, lá no chão da escola, de exercer nossa liberdade e autonomia enquanto profissionais da educação, ou mesmo quando isso se transforma em tirania de alguns gestores que, imbuídos de tanto poder, se desviam do bom exercício desses preceitos, não devemos abrir mão dessa potente construção.

Alguém já nos alertou da responsabilidade cada vez maior que temos quando adquirimos mais poder. E trata-se mesmo de uma grande verdade: grandes poderes vêm sempre acompanhados de maiores responsabilidades.

E é isso que não devemos perder nunca de vista, em especial nessa semana em que comemoramos a nossa independência política enquanto nação que somos: a liberdade e a autonomia de nosso país, comemorados nesse próximo dia 7 de setembro, nos inspiraram a construir um sistema educacional que também preza por esses valores e princípios.

Que saibamos exercê-los com altivez e responsabilidade. Viva a Independência do Brasil e de nossas escolas! Que nunca nenhuma resolução, como a atual BNCC, tente nos tirar isso!

Heleno é professor, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e atual coordenador do Fórum Nacional da Educação (FNE).