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“História em Movimento: Sintep, Dom Pedro Casaldáliga e o Congresso dos Professores no Araguaia!”

Publicado: 27/06/2024 17:38

No árido coração do Mato Grosso, onde o sol parece tecer o chão e o vento varre segredos entre os manguezais de Luciara, desenrolou-se uma das epopeias mais linda da história do Sintep, sindicato dos trabalhadores da educação do Mato Grosso, que semeou resistência no chão poeirento da educação pública.

Sob a batuta firme do Professor Elismar Bezerra, o sindicato rompeu os limites do possível ao planejar um congresso de proporções mitológicas, que desafiaria até mesmo os espíritos mais bravios dos professores do estado, em São Félix do Araguaia.

Foi numa era onde estradas eram cicatrizes na terra, onde o cascalho parecia rugas de um tempo imemorial, que se gestou a jornada épica de Cuiabá a São Félix do Araguaia para realização de um congresso formação e organização sindical dos professores do Mato Grosso.

Uma jornada de 30 horas de ônibus, cujos destinos se estendiam para além das estradas de concreto: a ilha do Bananal e as terras ancestrais do povo Karajá. Não era apenas uma viagem geográfica, mas também espiritual, uma promessa de encontro com Dom Pedro Casaldáliga, o bispo do povo.

Elismar, oriundo da cidade de Luciara, era como se fosse um filho das mangas, líder que florescia como os frutos que caracterizavam sua terra natal. Para ele, o congresso não era apenas um evento, mas um rito de passagem e uma oportunidade de formação revolucionária para os professores do estado.

Ao lado de João Monlevade e Carlos Abicalil, seus assessores de alma enraizada na rebeldia sindical da época, planejou-se um encontro onde o sofrimento se metamorfosearia em conhecimento, onde as agruras do caminho seriam o cálice de uma comunhão de ideais.

E assim, na praia do Araguaia, onde o rio se alarga como um espelho de esperanças, ergueu-se o circo para realizar o congresso, que abrigaria os sonhos e desilusões dos mestres do saber dos rincões do Mato Grosso, que enfrentaram pau, poeira e estrada para estar ali…

Dom Pedro Casaldaliga, o bispo profeta do Araguaia e grande expectativa do congresso, infelizmente não pôde comparecer pessoalmente à abertura do evento devido a compromissos que o levaram à Espanha na véspera. No entanto, sua presença foi sentida através de uma fita cassete que ele deixou com a organização. Suas palavras ressoaram como fagulhas de um fogo sagrado, ecoando profeticamente enquanto ao fundo um galo, guardião dos tempos, entoava seu canto. Esta gravação conferiu ao evento uma aura de solenidade e a presença espiritual de um verdadeiro bispo do povo.

Os olhos dos professores, testemunhas do que parecia um milagre desgarrado no tempo, absorviam cada sílaba como se fossem pétalas de uma flor rara. Nas palavras do bispo, ecoava a força das águas que esculpiram o Araguaia, a resiliência das árvores que sombreavam o povo Karajá, e o clamor daqueles que se erguiam contra a injustiça. Uma jornada de 30 horas de viagem foi feita somente para ouvir Dom Pedro Casaldáliga falar, um ato de devoção e esperança que transcendeu as barreiras físicas e temporais.

Mas como nem toda história é feita apenas de triunfos. Naquele congresso, onde se esperava a união sagrada dos mestres, a sombra também se fez presente. Os desafios da jornada de formação, a falta de infraestrutura que cintilasse à altura dos sonhos, revelou-se como espinhos entre os girassóis da esperança. A fita cassete, símbolo da ausência e da espera, foi ao mesmo tempo uma lição de perseverança.

E assim, entre as noites de estrelas vívidas e os dias de sol inclemente nas praias do Araguaia, o Sintep deixou suas marcas na história. Elismar, o líder das mangas, e seus camaradas, ergueram um bastião de resistência, onde o aprendizado se misturava à dor e à esperança como tintas num quadro de vida.

Hoje, as estradas do Araguaia podem ter se transformado, o tempo moldado novas rugas na terra, mas a história daquele congresso, tecido entre mangas e fitas cassete, permanece como uma canção guardada nos corações daqueles que ousaram sonhar além dos horizontes conhecidos.

Elismar Bezerra era chamado nos bastidores, como o “líder das mangas” devido à sua origem na cidade de Luciara, Mato Grosso, conhecida pela abundância de pés de mangueira que adornavam suas ruas e margens do rio no Araguaia. Essas árvores frutíferas não só embelezavam a cidade, mas também eram uma fonte de sustento e da cultura e identidade local.

O congresso do Sintep realizado em São Félix do Araguaia teve a assessoria de João Monlevade e Carlos Abicalil, figuras fundamentais na organização e planejamento do evento. Ambos contribuíram significativamente para a estruturação e orientação do congresso, que se tornou um marco na mobilização sindical e na conscientização dos desafios enfrentados pelos professores do interior do Mato Grosso.

Após o congresso histórico em São Félix do Araguaia, Carlos Abicalil seguiu uma trajetória política ascendente, tornando-se deputado pelo PT anos mais tarde. Sua atuação parlamentar continuou focada em questões educacionais e sociais, refletindo sua dedicação aos ideais de justiça e igualdade.

João Monlevade, por sua vez, assumiu um papel crucial como assessor parlamentar na área de educação no Congresso Nacional. Sua experiência e conhecimento adquiridos no movimento sindical foram fundamentais para influenciar políticas públicas voltadas para o setor educacional em nível nacional.

Elismar Bezerra, após suas contribuições no sindicalismo e no cenário cultural de Mato Grosso, foi nomeado secretário de cultura no primeiro governo de Dante de Oliveira no Mato Grosso. Mais tarde, ele ocupou o cargo de secretário de educação na gestão de Murilo Domingos em Várzea Grande, demonstrando seu compromisso contínuo com a melhoria da educação e da cultura em diferentes esferas administrativas. Atualmente tornou-se doutor em educação pela universidade Federal Fluminense e vive com aposentado em Chapada dos Guimarães.

Esses caminhos individuais dos protagonistas refletem não apenas suas trajetórias pessoais, mas também o impacto duradouro que tiveram nas áreas em que atuaram, marcando uma era de transformação e avanço nas políticas públicas e na defesa dos direitos dos trabalhadores da educação.

Nota do autor:

Caro leitor,

Escrever sobre a experiência marcante no Congresso dos Professores no Araguaia é retornar aos dias de intensa reflexão e descoberta, onde os caminhos da história se entrelaçam com as nossas próprias jornadas.

Ao lado do Professor César Espíndola de Diamantino, uma figura cujo compromisso com a educação e o saber é tão profundo quanto suas raízes no Mato Grosso, trilhamos juntos uma viagem não apenas geográfica, mas também espiritual.

Partimos como os primeiros do Sintep, os educadores que carregam não só livros, mas ideais de justiça e transformação social. Na estrada, entre paisagens que contam histórias silenciosas, folheávamos as palavras de Pedro Casaldáliga, cuja voz ecoa como um farol de esperança nas lutas pela dignidade humana e ambiental.

Neste encontro de mentes e corações, o legado de Dom Pedro Casaldáliga se entrelaça com nossas próprias vidas, nos desafiando a sermos agentes de mudança, mesmo nas estradas empoeiradas que levam aos rincões esquecidos do nosso país.

Cada página virada, cada quilômetro percorrido, foi um testemunho vivo da perseverança e da solidariedade que nos fortalece como professores e como cidadãos comprometidos com um mundo mais justo e igualitário.

Em memória desta caminhada compartilhada e em homenagem ao Professor César Espíndola, que com sua sabedoria e humildade nos guiou nessa viagem, reafirmamos nosso compromisso com a educação transformadora e com a defesa incansável dos direitos humanos.

Que nossas vozes se unam em coro, ecoando as lições aprendidas nos campos do Araguaia, para que o legado de luta e esperança perdure nas gerações futuras.