ENSINO HÍBRIDO: A Inovação que ameaça a extinção da carreira docente em Mato Grosso


Desde que Mauro Mendes assumiu o governo do estado de Mato Grosso, em 2019, a educação pública tem enfrentado ataques sistemáticos. A nova investida do governo é a implementação do projeto-piloto da Rede de Inovação para Educação Híbrida (RIEH), uma política de suposta "modernização" que, na prática, representa um retrocesso para a carreira docente e a qualidade da educação pública.

Publicado: 27/09/2024 17:45 | Última modificação: 27/09/2024 17:45

Escrito por: Gilmar Soares Ferreira

Reprodução

EDUCAÇÃO HÍBRIDA
Tecnologia a Serviço do desmonte da Educação Pública

O governo, apoiado por interesses privados e forças neoliberais, está pavimentando o caminho para um modelo educacional que diminui o papel do professor e transforma a educação em um negócio lucrativo para grandes corporações tecnológicas. O projeto da RIEH, coordenado pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) em parceria com o Ministério da Educação (MEC), parece, à primeira vista, uma iniciativa inovadora. No entanto, sua implementação na rede pública de Mato Grosso evidencia uma tentativa de disfarçar o desmonte da educação. O governo de Mauro Mendes, ao priorizar o ensino híbrido, utiliza uma narrativa enganosa de modernização para ocultar sua incapacidade de resolver os problemas estruturais da educação pública. Ao invés de priorizar concursos públicos e a valorização profissional, o governo aposta na substituição gradual dos professores por tutores digitais e ferramentas tecnológicas, precarizando assim a relação pedagógica.

Essa abordagem é sustentada por uma lógica mercantil, e não educacional. O foco está na produção massiva de conteúdos digitais e na padronização da educação, beneficiando empresas do setor tecnológico, e não os estudantes ou professores. Durante a pandemia de COVID-19, vimos claramente os limites e os fracassos do ensino remoto: aumento das desigualdades educacionais, falta de interação significativa entre aluno e professor, e uma queda drástica na qualidade do ensino. Mesmo diante desses problemas, o governo insiste em um modelo que repete esse fracasso e afasta ainda mais a educação pública de seu compromisso social.

O TUTOR DIGITAL
A Falsa Solução para os Desafios Educacionais

A promessa do governo de que o tutor digital será um suporte pedagógico é uma ilusão perigosa. A função do professor vai muito além de transmitir conteúdo; o educador é responsável por mediar o processo de aprendizado, compreender as necessidades específicas de cada estudante, promover o pensamento crítico e construir uma relação humanizada dentro da sala de aula. Nada disso pode ser substituído por uma tela ou uma plataforma online.

O fracasso desse modelo ficou evidente durante a pandemia, quando muitos alunos perderam acesso à educação de qualidade. O resultado colhemos na atualidade: alunos não-alfabetizados avançam no seu percurso formativo, sem a aprendizagem necessária, por intervenção da própria Seduc em manipular dados dos diários dos professores, alterando notas e conceitos. Pior, o ensino em Mato Grosso nada mudou em termos de tempo e infraestrutura, fora os investimentos vultosos em digitalização para atender interesses empresariais. 

O ensino híbrido agrava ainda mais a situação, especialmente em regiões com dificuldades de acesso à internet, como periferias, áreas rurais, indígenas e quilombolas de Mato Grosso. Essas comunidades possuem práticas pedagógicas específicas que não são contempladas por soluções impessoais e tecnológicas, o que coloca em risco o direito dessas populações a uma educação inclusiva e diversificada.

Um Projeto Político que Precariza o Trabalho Docente

A aposta do governo estadual no ensino híbrido faz parte de um projeto político mais amplo, que visa precarizar o serviço público e desmontar as políticas de valorização dos trabalhadores da educação. Nos últimos sete anos, não houve concursos públicos abrangentes para a contratação de novos professores; a implementação das escolas cívico-militares destruiu o princípio da gestão democrática, e o arrocho salarial desmotivou os profissionais da educação. Além disso, a ausência de diálogo e a imposição de medidas sem participação das categorias profissionais têm levado ao adoecimento dos docentes e à sobrecarga de trabalho.

Essa política de mercantilização da educação transforma alunos em consumidores e professores em meros operadores de um sistema, com o objetivo final de privatizar e desregulamentar o ensino. Ao promover o ensino híbrido como solução mágica, o governo de Mauro Mendes está pavimentando o caminho para a extinção gradual da carreira docente, substituindo profissionais qualificados por soluções tecnológicas baratas e ineficientes.

O modelo cívico-militar e a introdução de plataformas digitais dissociadas das realidades das comunidades escolares refletem uma visão autoritária e tecnocrática da gestão pública, que enxerga a educação como um produto, e não como um direito social. Como resultado, os professores enfrentam condições de trabalho cada vez mais precárias, a desvalorização da carreira e o afastamento da população das decisões que afetam diretamente o futuro da educação pública.

O FUTURO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA EM MATO GROSSO

O Futuro da Educação Pública: Resistir à Mercantilização e Valorizar os educadores

Diante desse cenário, o SINTEP-MT deve reafirmar sua posição em defesa da educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada. A verdadeira inovação no ensino não está em estúdios ou tutores digitais, mas na valorização dos profissionais da educação, na garantia de condições dignas de trabalho e no respeito às especificidades de cada comunidade. A luta contra a mercantilização da educação é também a luta contra um projeto político que desumaniza o ensino, afastando-o de seus princípios fundamentais de inclusão, democracia e justiça social.

É necessário perguntar: a quem realmente serve essa "inovação" da Seduc-MT? Estamos preparando nossos alunos para um mundo digital ou negando-lhes o direito a uma educação que respeite suas especificidades e ofereça uma formação crítica e cidadã? O futuro da educação pública não pode ser pautado por interesses mercadológicos que tratam a educação como um negócio e negligenciam a importância do professor na formação das futuras gerações.

A EDUCAÇÃO NÃO É MERCADORIA

O governo Mauro Mendes transformou o estado de Mato Grosso em um balcão de negócios, onde soluções vazias e caras são vendidas como inovação. Mas a educação pública não pode ser tratada como mercadoria. Ela é um direito fundamental, que deve ser garantido por políticas públicas que valorizem seus trabalhadores e atendam às reais necessidades da população.

Mesmo o Governo Mauro Mendes buscando promover entidades para apenas aplaudi-lo em seus desmandos autoritários, O SINTEP-MT seguirá firme na luta contra os mercadores de soluções fáceis e na defesa de uma educação pública que respeite e valorize o papel dos educadores, oferecendo uma formação integral e crítica para os filhos e filhas da maioria da população, como escola de tempo integral com foco na formação humana, cidadã e profissional. A resistência a esse projeto político de desmonte é urgente e necessária, pois o futuro da educação depende da capacidade de dizer "não" à mercantilização e "sim" à valorização do professor e ao fortalecimento da educação pública de qualidade que coloca no centro o processo de ensino-aprendizagem conduzido por quem está nas unidades escolares.

Gilmar Soares Ferreira é Licenciado em Filosofia com especialização em Psicopedagogia. É Professor de Humanas da Rede Estadual de Ensino de Mato Grosso, efetivo desde 2000 e foi presidente o Sintep-MT por 2 mandatos (2006-2012) e Membro da Direção Executiva da CNTE (2005-2021). Atualmente é Secretario Adjunto de Políticas Educacionais do Sintep-MT e Mestrando do PROFEI – Programa do Mestrando em Educação Inclusiva, Unemat - Campus de Sinop – MT.