Artigo

Quem pode medir a dor de uma menina estuprada a caminho da escola?

Publicado: 15/07/2024 10:48

Mais um estupro, uma tragedia de conhecimento de todas as autoridades 

 

Várzea Grande é uma cidade cercada por grandes vazios urbanos. Ninguém melhor sabe disso do que sua própria população que sofre dia a dia as mazelas da ausência de serviços públicos insuficientes, a exemplo do transporte público.   Na maioria das escolas públicas, estudantes tem que atravessar grandes matagais a pé, pois não contam com um transporte seguro, muito menos com transporte escolar. 

Nesta semana mais uma menina criança foi estuprada a caminho da escola. Desesperadora realidade, mais uma tragédia que se abate sobre nossas crianças.  Qual a responsabilidade dos governantes por esta vilania, por este ato de covardia, criminoso? Principalmente pelo fato de que esta criança, por não ter matrícula acessível em seu bairro, tem que se deslocar para estudar em um bairro distante de sua residência por causa do chamado REDIMENSIONAMENTO imposto pelo Governo do Estado e sordidamente acatado, sem amplas discussões e sem considerar as dificuldades da população, pelas autoridades municipais em Várzea Grande.  

Este maléfico projeto (do desastroso redimensionamento de matrículas e escolas) pensado e executado por quem não tem filhos matriculados em escolas públicas, não considera e não considerou, bem como, também,  não perguntou para as famílias que as vezes habitam lugares longínquos, rodeados por matagais, ferros velhos, amplas áreas desabitadas,  o que é ter que deixar um filho em uma escola e outro filho ou filha em outra escola bem distante. As ditas autoridades que impuseram este redimensionamento ignoraram que a realidade para as famílias piora quando são mais de dois filhos em idade escolar que são obrigados a estudar em escolas e bairros diferentes.

Fato é, que o redimensionamento separa irmãos, dificulta o trabalho na gestão da escola, expõe as famílias a um alto custo de deslocamento dos alunos, promove indiretamente a evasão escolar. No fundo,  destrói toda a  política de ensino e aprendizagem, fragmentando a formação desse estudante quando obriga  a criança a frequentar a educação infantil em uma unidade escolar,  do 1º  ano  ao 6º ano do Ensino Fundamental em outra escola e, do 7º ao 9º ano em outra unidade escolar, bem como, o Ensino médio em outra unidade escolar, algo contraria a própria legislação prevista da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.  Ou seja, uma constante descontinuidade da proposta curricular e de mudanças de escolas que não geram   pertencimento a uma comunidade escolar além de expor as famílias e os estudantes às dificuldades de uma cidade em que a gestão sequer consegue manter a regularidade da limpeza das vias urbanas na periferia, onde se encontram a maiorias das nossas unidades escolares, sejam rede estadual e rede municipal, esta última que possui o maior número de escolas.

Quem vai se responsabilizar por esta menina estuprada a caminho da escola, que deveria estar protegida pelo ECA e rede assistência? Convém observar o que diz a legislação.

O Estatuto da Criando e do Adolescente, em seu Art. 3º afirma: “A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.” Também em seu Art. 4o , inciso X, a legislação assegura “vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) anos de idade.”

Está claro que a responsabilidade do Estado em um caso de estupro de uma criança a caminho da escola é garantir a proteção e o amparo a essa vítima, investigar e punir o indivíduo responsável pelo crime, oferecer apoio psicológico, médico e social à criança e sua família, e implementar políticas de prevenção e combate à violência sexual contra crianças.
As vítimas de estupro, em especial uma criança, com certeza,  enfrentará traumas físicos e psicológicos. Tal tragédia Interrompe sonhos. Somente um acompanhamento adequado poderá ajudar na superação das consequências na vida criança. Assim, é fundamental que a criança receba todo o apoio necessário para superar o trauma do estupro, incluindo acompanhamento psicológico, atendimento médico especializado, suporte legal, proteção contra possíveis retaliações e medidas preventivas para evitar que novas situações de abuso ocorram. 

Vale citar, aqui, que o Sintep Subsede de Várzea Grande notificou via ofício a todas as autoridades o caso e as necessidades desta criança, que nesta matéria omitiremos seu nome, o nome do bairro e da escola em que a mesma estuda, para preservação da própria criança e da família, sendo que o Boletim de Ocorrência foi devidamente registrado.

Resta-nos a esperança enquanto educadores organizados no Sintep/MT que as autoridades deste município e estado tomem as devidas providências para a defesa e manutenção da segurança de nossas crianças a caminho da escola e que a população possa ser ouvida nas suas necessidades.

Maria Aparecida Arruda Cortez é Técnica Educacional Aposentada da rede estadual e sindicalista da educação no município de VG/MT