O orçamento é um espaço de disputa de poder entre classes sociais antagônicas. Isto fica claro quando analisamos preliminarmente a Lei de Orçamento Anual de qualquer esfera do Estado seja federal, estadual ou municipal. No caso do Estado de Mato Grosso a estimativa da receita para o exercício de 2025 é de R$ 38,032 bilhões, que representa um crescimento superior de 7,81% em relação ao 2024 de R$ 35,060 bilhões. Mesmo passando por audiências públicas o caráter de classe do orçamento é dado pela correlação de força onde prevalece o domínio da bancada BBBB (Boi, Banco, Bíblia e da Bala) entre os deputados estaduais.
Quando analisamos as dotações orçamentárias fica claro essa dimensão de classes. Do total de R$ 38,032 bilhões, a despesa do Governo com o pessoal e encargos sociais é de R$ 21,195 bilhões, referente a saúde, educação, segurança, etc. Dentro disso temos a previsão de reposição da inflação pela Revisão Geral Anual (RGA) de 3,45%, com o pagamento previsto a partir de janeiro de 2025 quando a inflação estimada para 2024 foi de 4,25 %. O reajuste, que não repõe todas as perdas geradas pela inflação, representa aos cofres públicos R$ 588,2 milhões. Neste momento temos que destacar que os R$ 21 bilhões destinados as despesas de pessoal e encargos têm uma grande contribuição para a economia real já que a quase totalidade destes recursos resultara em consumo que ativa a economia como um todo, influenciando na própria receita do Estado.
Ao mesmo tempo, o Estado de Mato Grosso destina para o pagamento do serviço da dívida estadual, entre juros e amortizações o valor de R$ R$ 786,3 milhões, valor bem superior aos R$ 588,2 milhões do RGA. Esse montante destinado ao pagamento do serviço da dívida ao contrário do dispêndio com pessoal e encargos tem como caminho o bolso dos rentistas que compram títulos da dívida pública, sejam banqueiros, seja fundos de pensão, sejam os barões dos agronegócios ou pequenos poupadores. Trata-se de uma atividade que não gera emprego e que acaba por deslocar para os estados mais ricos onde se encontram os principais rentistas um volume de recursos gerados em MT.
Vale destacar que grande parte desta dívida pública, que deveria ser auditada como manda a Constituição Federal, foi constituída desde o Regime Cívico militar, sendo federalizada pela Lei 9496/97 em 1997, quando foi rolada por 30 anos, exigindo-se as privatizações das empresas estatais estaduais. Conforme levantamento da Auditoria cidadã as dívidas dos estados já teriam sido pagas quatro vezes em 2016, quando surgiu a Lei Complementar 156, que fez uma nova renegociação por mais vinte anos e uma nova etapa de privatizações estaduais. Tudo isso se deve a pratica do anatocismo (juros sobre juros entre entes estatais) considerado ilegal pelo STF conforme a Súmula 121, a cobrança do IGP-DI mais taxas de juros elevadas. Além disso, essas dívidas estaduais resultaram principalmente dos passivos dos bancos estaduais (BEMAT, PRODUBAN, BANESTADO, etc) originados nos empréstimos feitos pelas burguesias estaduais que não foram pagos e se converteram em dívida pública, que atualmente comprometem o financiamento das políticas sociais.
Todavia, o fato mais evidente do caráter de classe do orçamento está na renúncia fiscal para 2025 do montante de R$ 13,354 bilhões ou mais da metade da despesa de pessoal e encargos que tem como endereço principal os barões do agronegócio, que já são beneficiados pela Lei Kandir, que desonera as exportações. Por outro lado, temos um estado que nas três esferas contribuí com a atividade do agronegócio e esses por sua vez, não contribuem com o financiamento do Estado. No entanto, esse setor econômico domina o poder político e acaba por influenciar a cada ano na Lei de orçamento que sempre lhes favorece. Com isso os servidores públicos, que são fundamentais para o atendimento da maioria da população, ficam cada vez em desvantagem enquanto o Estado direciona suas receitas para a acumulação privada e privatiza até mesmo as rodovias. Com isso crescimento da economia acaba por não beneficiar os servidores. Em Mato grosso a frase de Delfim Neto continua em evidência: deixa o bolo crescer para depois distribuir.
José Menezes Gomes (professor da UFAL no curso de economia e do Programa de Pós em Serviço social, coordenador do núcleo alagoano pela auditoria cidadã e membro da RICDP.)